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Você viu esta borboleta por aí?

borboleta menor

Projeto de doutorado inova buscando informações nas redes sociais sobre espécies ameaçadas de extinção.

 

Uma fonte de dado inusitada no campo da conservação da biodiversidade: o Facebook, a rede social que abrange mais de 2 bilhões de usuários no mundo, dos quais 130 milhões são brasileiros. A ideia é do doutorando Augusto Rosa, do Programa de Pós Graduação em Biologia Animal da Universidade Estadual de Campinas e membro do LABBOR (Laboratório de Ecologia e Sistemática de Borboletas), inspirado por iniciativas prévias que haviam dado bons resultados: “Começamos a observar que as pessoas postavam e compartilhavam no Facebook suas fotos de borboletas e o local onde a encontraram”, observa Augusto e complementa “por que não garimpar e organizar estes dados – por vezes inéditos – para a ciência?”

O projeto também conta com a participação de Onildo Marini-Filho, do ICMBIo (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), que junto com Augusto Rosa e seu orientador, André Freitas, são integrantes do comitê de especialistas do Ministério do Meio Ambiente que revisa regularmente a lista vermelha de borboletas e mariposas ameaçadas. A última publicação é de 2014 e listava com 58 espécies ameaçadas. A tarefa do grupo é buscar informações que possam embasar a revisão do status de grau de ameaça destes insetos.

Além dos levantamentos de informação mais convencionais para a elaboração destes instrumentos de conservação da biodiversidade (publicações científicas e relatórios), o doutorando percebeu que poderia inovar com uma fonte de dados que tem sido cada vez mais acessada pelos cientistas em todo mundo: o cidadão comum.

E foi assim que o doutorando se entusiasmou com a ciência cidadã, o nome dado à ciência que é baseada na participação de cidadãos na geração de conhecimento. Essa participação pode se dar de diferentes formas, desde a coleta de dados voluntariamente para uma pesquisa até a definição conjunta de questões científicas. No caso de Rosa, os cidadãos colaboram com seus registros de visualização de borboletas.

O foco de coleta de dados do doutorando são grupos de especialistas e observadores de borboletas e mariposas no Facebook. Atualmente, o pesquisador monitora de cerca de 10 grupos, alguns com mais de seis mil integrantes do Brasil e do exterior.

 

Além de registrar todos os dados de ocorrência de espécies já postados espontaneamente pelos internautas nestes grupos, Rosa também induz a busca de informações de espécies ameaçadas publicando os posts “Você viu essa borboleta?”. Nestas chamadas, ele divulga a imagem de uma borboleta ameaçada juntamente com informações sobre locais de ocorrência no país e informações da sua pesquisa.

“Já postamos oito chamadas, e obtivemos três registros novos para borboletas, o que considero satisfatório, já que começamos a sistematizar esta coleta em janeiro deste ano”, diz o lepidopterólogo, especialista em borboletas e mariposas. O doutorando está elaborando um guia simples para identificação das espécies ameaçadas e o deixa disponível em um link para a consulta dos internautas.

Para ser considerado um novo registro de ocorrência de espécie, o registro deve cumprir alguns requisitos. Primeiramente, junto ao relato deve haver necessariamente uma foto de qualidade, que permita a correta identificação. Em segundo, o local de ocorrência não deve estar muito fora do esperado. “Por exemplo, via de regra, muitas espécies ameaçadas do bioma Mata Atlântica não ocorrem na região amazônica. Entretanto, podem ocorrer em outras localidades da Mata Atlântica que ainda não sabemos”, explica Rosa.

Exemplo de interação com os usuários do Facebook.

Diariamente o doutorando checa todas as redes sociais em busca de novos registros ou respostas às chamadas. Quando há algum retorno com fotos e localidade, o caçador de registros de borboletas verifica a consistência da informação. “As espécies de borboletas podem ser muito parecidas, especialmente para os leigos, sendo muito comum ocorrer confusão”, relata o pesquisador. Rosa agradece ao voluntário e, se necessário, auxilia com alguma questão de identificação da espécie. O registro é então catalogado em uma grande planilha de controle, na qual Rosa documenta a ocorrência, a data, a espécie e os contatos do colaborador.

“O importante para nós é a participação dos voluntários e o retorno com fotos, assim conseguimos ter mais registros e também avaliar o alcance do nosso trabalho”, explica André Freitas, orientador da tese e professor do Instituto de Biologia.

Um exemplo de como estas colaborações voluntárias podem contribuir para as discussões de conservação ocorreu em 2016 com a espécie Drephalys mourei. “Em decorrência de uma foto publicada no Facebook de uma espécie ameaçada que foi fotografada em fragmento florestal em Morro Agudo (SP), alavancaram-se questionamentos dos limites entre grau de ameaça das borboletas e espécies raramente avistadas”, relata Freitas. O tema foi longamente discutido no último processo de avaliação de espécies ameaçadas e decidiram, na ocasião, pela atribuição da categoria “deficiente de dados” a todas aquelas espécies difíceis de serem observadas na natureza por uma questão comportamental e não obrigatoriamente de ameaça.

O trabalho posteriormente foi publicado na revista Journal of the Lepidopterists’ Society e o autor da foto, Marcos C. Campis, também foi convidado para ser autor da publicação científica.

O Brasil contabiliza cerca de 4000 espécies de borboletas descritas. A tarefa de monitorar o status de conservação destas espécies não é uma tarefa simples e toda informação é importante e bem-vinda. “Precisamos sair da academia, firmar parcerias com diversos setores da sociedade e mostrar o nosso trabalho”, finaliza Freitas.

Para acompanhar as postagens da série “Você viu essa borboleta?”, siga as postagens no LABBOR no Facebook e acesse o Guia de Identificação de Borboletas Ameaçadas aqui.