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Pesquisadores apostam na colaboração para gerar transformações rumo à sustentabilidade

FotoOficialBiotaTransformação

Pesquisadores dos projetos apoiados pela Chamada “BIOTA-FAPESP: Transformação – Promovendo Transições para Sustentabilidade” reuniram-se em um workshop de dois dias para trocar experiências e discutir mecanismos de acompanhamento e avaliação das pesquisas. O foco central dos debates foi sobre como os diferentes projetos tem aplicado as abordagens transdisciplinares e de coprodução de conhecimento, que integram saberes acadêmicos e comunitários, para enfrentar problemas socioambientais complexos no estado de São Paulo. As discussões evidenciaram a centralidade dos processos colaborativos envolvendo cientistas, agricultores, comunidades tradicionais, gestores públicos e outros atores sociais para a geração de transformações reais nos territórios.

Ainda que abordem uma grande diversidade de questões e de caminhos de pesquisa, todos os doze projetos apoiados na Chamada se baseiam em processos de coprodução do conhecimento, isto é, na interação entre pesquisadores e pessoas de fora do ambiente acadêmico (como lideranças políticas e sociais, por exemplo).

No Alto Paranapanema, por exemplo, a pesquisa liderada por Débora Rother (UFSCar Lago do Sino) parte das demandas de gestão ambiental relacionadas à redução da vegetação nativa levantadas durante a elaboração dos Planos Municipais de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica e Cerrado de sete municípios da região. Essa redução da vegetação está diretamente relacionada à expansão agropecuária e uma das estratégias em desenvolvimento pela equipe é a elaboração de um protocolo com combinações funcionais de espécies vegetais que auxiliem na restauração de áreas degradadas e no provimento de serviços ecossistêmicos relacionados ao controle de pragas. No caso deste projeto, as reuniões com parceiros ocorreram antes do início da proposta para compreensão e escolha das demandas a serem trabalhadas conjuntamente.

Esse levantamento de demandas locais a serem trabalhadas conjuntamente antes do início dos processos de coprodução foi um dos pontos discutidos ao longo do workshop. Muitos projetos se valeram de experiências prévias ou em andamento como propulsoras para a proposta atual. É o caso do projeto coordenado por Fábio Motta (iMar/UNIFESP) que nasceu como um projeto de ciência cidadã em 2023 voltado para investigar a ocorrência de raias a partir de entrevistas com mergulhadores e agora amplia seu escopo para identificar os mecanismos e caminhos para planejar, e construir junto com pescadores, a implementação de um sistema de Pagamentos por Serviços Ambientais com foco na proteção de raias.

A pesquisadora Kátia Ferraz (ESALQ/USP) coordena um projeto que estuda a coexistência entre humanos e animais em em diferentes áreas do Estado de São Paulo como a região de Piracicaba, dos Parques Estudais de Intervales e da Serra do Mar e da APA São Francisco Xavier. “A proposta do projeto Biota-Coexiste é desenvolver um modelo de pesquisa baseado em coprodução, coplanejamento e coimplementação de planos de ação que previnam conflitos entre seres humanos e animais”, explica a pesquisadora. A proposta também tomou como base a experiência de projetos anteriores, no caso, o Vizinhos Silvestres, que há 5 anos trabalha com a mesma temática na região de Piracicaba e já tem medido transformações nas relações de coexistência.

Entre os diferentes pontos discutidos ao longo dos dois dias de workshop esteve a discussão sobre a importância da coautoria dentro das coproduções: se a produção de conhecimentos é realizada de forma conjunta, o mesmo pode se aplicar à autoria de artigos, ao direito de uso de imagens, ao licenciamento de produtos e à propriedade intelectual dos resultados gerados nesses processos. É o exemplo do projeto coordenado por Denise Dantas (FAU/USP) , que emprega o o conceito de codesign em três municípios paulistas para cocriar soluções que melhorem a comercialização de produtos de sistemas agroflorestais, identificando a qualidade e os benefícios desses sistemas e a criação coletiva de uma estratégia de comunicação que valorize essas características. O projeto terá entre os resultados a produção de embalagens e materiais de comunicação, por exemplo, e a discussão sobre a coautoria o direito sobre essas produções segue em aberto.

Inspirado por essa discussão, Renato Lorza, gestor da APA São Francisco Xavier que participa do projeto Biota Coexiste, resolveu, logo após o evento, convidar guias de turismo da APA para escrever um artigo ou nota sobre os conhecimentos que desenvolveram no processo de formação da cadeia produtiva das sementes florestais. “Desde 2017 aprimoramos este trabalho por meio de diversos projetos e parcerias e mapeamos mais de 2200 matrizes em 27 sítios locais e identificamos as espécies da dieta dos muriquis e das jacutingas. Neste processo de formação descobrimos algumas coisas que não estão na bibliografia técnico-científica e agora, com ajuda do projeto Biota Coexiste, vamos organizar este conhecimento e tentar publicar um ou mais artigos ou notas científicas. A minha vontade é que guias locais da APA sejam os primeiros autores, e nós os apoiemos tecnicamente” explica Lorza.

A riqueza das experiências é acompanhada por desafios compartilhados. Os pesquisadores destacaram a necessidade de adaptar as rígidas estruturas acadêmicas e de fomento à natureza flexível e demorada da pesquisa coproduzida. Alguns pontos críticos foram levantados como a dificuldade para o custeio itens essenciais para a participação comunitária, como transporte e alimentação, devido ao formato de financiamento e, especialmente, o formato dos sistemas de avaliação acadêmica nem sempre capturam o impacto social e a complexidade dessas pesquisas. Como reforçou Jean Paul Metzger (IB/USP e do Comitê Científico do Programa Biota/Fapesp), “a forma de fazer pesquisa com mais impacto social é, em si, uma inovação e precisamos conseguir medir e acompanhar esses processos”.

Diante desses desafios, o grupo pactuou algumas ações coletivas para fortalecer essa forma de fazer ciência, com ênfase no detalhamento dos impactos sociais já vislumbrados e a busca pelo desenvolvimento de métricas para medir a efetiva transformação socioambiental promovida pelos projetos.

 

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