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Crise da biodiversidade e climática devem ser enfrentadas em conjunto, de acordo com cientistas

Mudanças sem precedentes no clima e na biodiversidade provocadas por atividades humanas estão aumentando as ameaças à natureza, às vidas humanas, seus meios de subsistência e o bem-estar em todo o mundo. A perda da biodiversidade e as mudanças climáticas se reforçam e são alimentadas pelas atividades econômicas humanas, portanto, nenhuma delas será resolvida se não forem combatidas conjuntamente. Estas são as principais mensagens do relatório do workshop “IPBES_IPCC co-sponsored Workshop report on Biodiversity and Climate Change” publicado no dia 10 de junho de 2021. O relatório foi elaborado por 50 cientistas de todas as regiões do mundo, ligados à Plataforma Intergovernamental de Políticas Científicas sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES) e ao Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).

Entre os autores brasileiros que participaram da publicação estão Adalberto Luís Val (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, INPA), Aliny Patrícia Flausino Pires (Universidade Estadual do Rio de Janeiro, UERJ), Bernardo Strassburg (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, PUC-Rio) e Maria de Los Angeles Gasalla (Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo, IO-USP).

Queimada no Pantanal. Foto: Oton Barros.

O relatório conclui que já existem políticas que abordam amplamente a perda de biodiversidade e as mudanças climáticas, entretanto, de forma independente uma da outra. Os especialistas afirmam que é preciso incentivar as sinergias entre estas políticas para mitigar a perda de biodiversidade e as mudanças climáticas e considerar seus impactos sociais. Deste modo, ampliam-se as oportunidades de maximizar os benefícios e a possibilidade de cumprir as metas de desenvolvimento global.

“As mudanças climáticas causadas pela humanidade estão cada vez mais ameaçando a natureza e suas contribuições para as pessoas, incluindo a capacidade de ajudar a mitigar as mudanças climáticas. Quanto mais quente o mundo fica, menos alimento, água potável e outras contribuições importantes que a natureza pode oferecer para as pessoas em muitas regiões do planeta”, afirma Hans Otto Pörtner, co-presidente do comitê científico. “As mudanças na biodiversidade, por sua vez, afetam o clima, principalmente por meio de impactos sobre o nitrogênio, ciclos do carbono e da água”, disse ele.

Os autores também alertam que ações estritamente focadas no combate às mudanças climáticas podem prejudicar direta e indiretamente a natureza, assim como ações voltadas exclusivamente para diminuir a perda da biodiversidade podem não ser efetivas na contenção das mudanças do clima. Entretanto, existem muitas medidas que podem fazer contribuições positivas significativas em ambas as áreas. Entre as  as ações mais importantes identificadas no relatório são:

  • Parar a perda e degradação de ecossistemas terrestres e marinhos ricos em carbono e em espécies;
  • Restaurar ecossistemas ricos em carbono e em espécies;
  • Aumentar as práticas agrícolas e florestais sustentáveis ​​para melhorar a capacidade de se adaptar às mudanças climáticas, aumentar a biodiversidade, aumentar o carbono armazenado e reduzir as emissões, e
  • Eliminar subsídios que apoiam atividades locais e nacionais prejudiciais à biodiversidade (como desmatamento, fertilização excessiva e pesca excessiva) e também apoiar ações de mitigação e adaptação às mudanças climáticas, junto com a mudança dos padrões de consumo individual.

Algumas medidas focadas na mitigação e adaptação ao clima também foram identificadas como prejudiciais à biodiversidade e as contribuições da natureza para as pessoas. Entre elas:

  • Plantar safras de bioenergia em monoculturas em grandes áreas;
  • Plantar árvores no sistema de monocultura em ecossistemas que não têm historicamente florestas;
  • Aumentar a capacidade de irrigação, e
  • Quaisquer medidas que se concentrem muito estreitamente apenas na mitigação das mudanças climáticas devem ser avaliadas em termos de seus benefícios e riscos gerais (por exemplo, bioenergia).

Os autores do relatório enfatizam que, embora a natureza ofereça maneiras eficazes de ajudar a atenuar as mudanças no clima, essas soluções só serão eficazes a partir de reduções ambiciosas de emissões de gases de efeito estufa decorrentes de atividades humanas. “A terra e o oceano já estão fazendo muito ao absorver quase 50% do CO2 das emissões humanas – mas a natureza não pode fazer tudo” disse Ana María Hernández Salgar, presidente da IPBES. “A mudança transformadora em todas as partes da sociedade e da nossa economia é necessária para estabilizar o nosso clima, parar a perda de  biodiversidade e traçar um caminho para o futuro sustentável que desejamos. Isso também exigirá abordar ambas as crises conjuntamente, de formas complementares.”

É importante notar que o relatório do workshop não foi submetido ao IPBES ou revisão do IPCC, e que  a cooperação entre ambos nesta ocasião não implica em endosso ou aprovação do IPBES ou do IPCC. Ou seja,  na elaboração do documento não houve a participação de governos na indicação dos participantes e na revisão do conteúdo e tampouco a negociação entre eles, como normalmente ocorre nas avaliações feitas pelos dois órgãos intergovernamentais.

Sobre o IPBES e o IPCC

O IPBES é o órgão intergovernamental que fornece aos formuladores de políticas avaliações científicas objetivas sobre o estado do conhecimento sobre a biodiversidade do planeta, os ecossistemas e as contribuições que eles fazem às pessoas, bem como as ferramentas e métodos para proteger e usar de forma sustentável esses ativos naturais vitais. O IPBES foi estabelecido como um órgão independente dos Governos em 2012 e possui 137 estados membros. Sua secretaria é mantida pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).

O IPCC é o órgão da ONU para avaliar a ciência relacionada às mudanças climáticas. Foi estabelecido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e pela Organização Meteorológica Mundial (OMM) em 1988 para fornecer aos líderes políticos avaliações científicas periódicas sobre as mudanças climáticas, suas implicações e riscos, bem como propor estratégias de adaptação e mitigação. No mesmo ano, a Assembleia Geral da ONU endossou a ação da OMM e do PNUMA em estabelecer conjuntamente o IPCC.  Atualmente o órgão conta com 195 Estados-membros.