A espécie Lasioseius biota foi encontrada na Caatinga, nos estados de Alagoas e da Bahia
Conhecer e descrever as espécies dos diferentes Biomas brasileiros é um esforço contínuo de pesquisadores em busca de preencher lacunas de conhecimento fundamentais para compreender a biodiversidade. Pesquisadores da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESAQ/USP) ligados ao Biota/Fapesp tem realizado, desde o início do Programa, esse esforço contínuo para entender e mapear a biodiversidade de ácaros no Brasil, bem como identificar potenciais agentes de controle biológico para a agricultura. Neste processo, uma nova espécie foi encontrada na Caatinga, nos estados de Alagoas e da Bahia, e batizada em homenagem ao Programa: Lasioseius biota.
“Quando identificamos a nova espécie, decidimos homenagear o Programa Biota devido ao apoio fornecido na construção do conhecimento sobre os ácaros no Brasil há muitos anos”, explica Ávyla Barros, uma das autoras da descoberta e doutoranda do Departamento Entomologia e Acarologia da ESALQ/USP. A descrição desta espécie é parte de um projeto maior, liderado pelos pesquisadores Gilberto Moraes e Raphael Castilho, também da ESALQ, que tem como objetivo principal estudar a diversidade dos ácaros de solo nos biomas brasileiros visando a prospecção de espécies para o controle biológico de pragas. Em especial, a pesquisa buscar conhecer a diversidade de ácaros da ordem Mesostigmata, cuja diversidade e aplicações para controle biológico são bastante conhecidos para ácaros que habitam a parte aérea das plantas mas com poucas informações sobre ácaros de solo.
A nova espécie encontrada pertence ao gênero Lasioseius, que é o maior da sua família (Blattisociidae), com mais de 200 espécies descritas. Os ácaros desse gênero habitam diversos ecossistemas, incluindo o solo, a serapilheira, e até mesmo em associações com animais e plantas e são conhecidos como predadores de insetos e outros artrópodes. A característica única do ácaro Lasioseius biota é a presença de setas em forma de folhas. As setas são estruturas que podem apresentar diferentes formas e tamanhos e estão espalhadas pelo corpo e pernas dos ácaros, em conjunto com outras estruturas, são usadas no processo de identificação (ver imagens ao lado).
“A nova espécie descrita foi encontrada quando estudamos a diversidade de ácaros no bioma Caatinga, que é um ecossistema ainda pouco explorado em relação aos organismos que habitam solo”, explica Barros, “a Caatinga também é frequentemente subestimada em termos de biodiversidade, devido ao clima árido, com baixa precipitação e altas temperaturas, e estudos como esse levantam questões interessantes sobre a riqueza de espécies nos diferentes biomas brasileiros”, completa a pesquisadora. Como exemplo a pesquisadora cita que em trabalho anterior a este, a equipe de pesquisadores identificou 20 espécies novas de ácaros de solo. “Além disso, os índices de diversidade encontrados foram iguais ou superiores aos de outros biomas brasileiros, como o Cerrado e a Amazônia. Os estudos de biodiversidade são fundamentais para o desenvolvimento de pesquisas mais aplicadas, além de oferecer insights valiosos sobre as adaptações evolutivas dos ácaros a esses ambientes”, completa Barros.
Da descoberta de espécies à aplicação na agricultura
Além de contribuir para a compreensão da biodiversidade e funcionamento dos ecossistemas, a descrição de novas espécies é também importante para o desenvolvimento de novas estratégias de controle biológico. As espécies do gênero Lasioseius, por exemplo, já foram relatadas como predadoras de pragas agrícolas, o que pode oferecer soluções sustentáveis e naturais para o manejo de pragas, contribuindo para a segurança alimentar e a conservação ambiental.
Mundialmente, sete espécies de ácaros do mesmo grupo estudado pelos pesquisadores brasileiros são comercializadas para o controle de pragas e parasitas que vivem no solo. No Brasil, apenas uma espécie é comercializada, por isso a importância de conhecer a biodiversidade existente e prospectar por espécies com potencial de aplicação. “É impossível fazer um trabalho aplicado sem saber o básico”, reforça Barros, “a identificação das espécies é uma parte do trabalho, depois disso nós voltamos ao ambiente, coletamos os ácaros vivos para estabelecer criações de laboratório, após esse processo, nós realizamos testes iniciais de predação em laboratório para verificar o potencial de predação dos ácaros predadores sobre diversas presas”.
Neste processo de estabelecimento, muitas espécies não se adaptam ao ambiente de laboratório e não são consideradas com potencial para o controle biológico. “Das 16 espécies que eu coletei em campo, apenas 8 conseguiram se estabelecer em laboratório. É a partir daí que começamos a testar as possíveis aplicações”, exemplifica Barros.
ARTIGO COMPLETO
Ávyla R. De A. Barros, Edmilson S. Silva, Gilberto J. De Moraes, and Raphael C. Castilho “Description of a new species of Lasioseius Berlese (Acari: Mesostigmata: Blattisociidae) from Brazil and redescription of Lasioseius meridionalis Chant,” Systematic and Applied Acarology 28(9), 1447-1465, (11 September 2023). https://doi.org/10.11158/saa.28.9.1