Projeto busca compreender a dinâmica do ciclo do carbono na Mata Atlântica acrescentando à discussão o papel dos componentes não arbóreos nesse processo.
Para compreender como as florestas estocam ou perdem carbono, pesquisadores estudam as variações da estrutura e composição das florestas. Com foco na Mata Atlântica, o projeto “Mudanças globais e tempo de residência do carbono na vegetação e no solo ao longo de um gradiente altitudinal” busca compreender a dinâmica do ciclo do carbono na área, levando em conta as variações ao longo do ano, entre anos, entre diferentes altitudes e usos da floresta. E, ainda, acrescenta à discussão o papel dos componentes não arbóreos – como as epífitas e os bambus, tão característicos da Mata Atlântica – nesse processo.
O projeto, que deve terminar no final de 2014 e é coordenado pela pesquisadora Simone Vieira, do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais da Unicamp, foi construído a partir de um outro projeto no qual ela participou em seu pós-doutorado: o “Gradiente Funcional”, também do Programa Biota/Fapesp. Ao longo do “Gradiente Funcional” 18 parcelas permanentes foram instaladas em diferentes altitudes da Mata Atlântica e foram avaliadas, especialmente, a estrutura e composição florística dessas áreas. “Nós tínhamos com essas informações uma fotografia: conseguimos determinar composição, solos, estoque de carbono, disponibilidade de água. Mas não tínhamos a ideia de como isso mudava com o tempo, então a posposta desse novo projeto surgiu para preencher essa lacuna, com enfoque no carbono”, explica Vieira.
Na primeira fase do projeto os pesquisadores determinaram o estoque de carbono em diferentes compartimentos da Mata Atlântica: estrato arbóreo, na madeira morta, no material orgânico do solo. E chegaram à conclusão que os componentes não arbóreos, como as epífitas e os bambus, eram bastante importantes na dinâmica da Mata Atlântica. “Minha formação foi na Amazônia, quando fui a campo fiquei muito impressionada com a quantidade de epífitas da região”, explica Vieira, “ e nós conseguimos construir um modelo para determinar a massa de epífitas baseado no diâmetro das árvores e no quanto aquela árvores estava ocupada”. Assim, os pesquisadores conseguiram determinar que na restinga as epífitas significam 1,25% da biomassa mas 14% o material fotossintético da área, o que tem um grande impacto no estoque de carbono local. “Agora estamos determinando as diferenças entre as altitudes, mas parece-nos que as epífitas são mais importantes na restinga e na floresta montana e um pouco menos presentes nas terras baixas. Acreditamos que esta é uma inovação do projeto: identificar compartimentos que eram renegados a segundo plano quando se fazia a pesquisa nas matas tropicais”, completa a pesquisadora.
Alguns estudos estão em fase de desenvolvimento como a datação de carbono 14 para determinar porquanto tempo o carbono fica armazenado nos diferentes compartimentos. A perspectiva é que essa datação possa auxiliar na compreensão de como manejar essa áreas para restauração ou servir como ferramenta de monitoramento para restauração de áreas.
A continuidade entre os diferentes projetos dentro do Programa Biota traz alguns benefícios, em especial, em termos de utilização da estrutura já instalada das parcelas permanentes. Para Vieira, estabelecer um conjunto de parcelas com essa quantidade de informações demanda tempo e é um processo trabalhoso e caro. “É importante continuar o estudos nesses locais, é uma forma de conseguirmos avançar no conhecimento, dado que já temos as informações básicas levantadas”, destaca ela, “além disso, importante o projeto estar inserido no Programa Biota porque a biodiversidade não é só a diversidade de organismos mas também a diversidade de sistemas”.
Diferentes parcerias surgem a partir do uso dos dados que já existem sobre as áreas estudadas e parcerias com pesquisadores de outras áreas. Atualmente, uma aluna de doutorado trabalha com pequenos mamíferos nesses mesmos locais, outro doutorando com decomposição relacionada a macrovertebrados e microdecompositores e há uma parceria com pesquisadores da área de microbiologia para ampliar os estudos sobre a diversidade e funcionamento dos microorganismos. Para Vieira, outros caminhos ainda estão em aberto: “uma possibilidade é um trabalho que associe a ecologia química e a diversidade biológica das áreas para que possamos compreender melhor os processos que determinam o funcionamento das florestas”.
Estudar o funcionamento de ecossistemas é algo que, para Vieira, tangencia a biodiversidade e faz também fronteira com o programa de mudanças climáticas. No caso deste projeto, a escolha por trabalhar no gradiente altitudinal se deu também por possibilitar a avaliação de como as mudanças de temperatura (que acontecem no gradiente altitudinal) podem impactar o funcionamento desses ecossistemas. “A partir dessa avaliação podermos começar a especular como seria o impacto das alterações de temperatura decorrentes das mudanças climáticas”, conclui Vieira.