Participação direta da comunidade em projetos de pesquisa é vista como uma forma de promover o desenvolvimento e a conservação local
O envolvimento das comunidades locais na conservação da biodiversidade, especialmente as que vivem no entorno ou dentro de Unidades de Conservação, é um desafio que tem sido enfrentado de diversas formas. Uma das possibilidades é a participação direta em projetos de pesquisa, como o treinamento de moradores locais para auxiliar na coleta ou monitoramento de dados. O projeto “Etnobotânica Participativa: conservação e desenvolvimento local no Parque Estadual da Serra do Mar – Núcleo Picinguaba, Ubatuba, SP, Brasil” traça outro caminho: partiu do encontro entre a expertise dos pesquisadores envolvidos e as demandas da comunidade para construir linhas de pesquisa e de ação em parceria com os moradores.
“A ideia surgiu num workshop promovido pelo Parque Estadual da Serra do Mar – Núcleo Pincinguaba/SP com vários pesquisadores que trabalham na região no qual foi diagnosticada a falta de estudos da área de humanidades e da área social para tratar da relação entre moradores, especialmente os quilombolas, e as Unidades de Conservação” conta Eliana Rodrigues, coordenadora do projeto e do Centro de Estudos Etnobotânicos e Etnofarmacológicos da UNIFESP.
Durante o ano de 2015 o projeto tomou forma com o encontro com outros pesquisadores interessados e a equipe organizou assembleias com as comunidades para saber as demandas dos moradores, sempre dentro da área de conhecimento dos envolvidos. O objetivo central do projeto é capacitar os colaboradores locais das duas comunidades quilombolas escolhidas para construir um registro do conhecimento tradicional sobre as plantas utilizadas pela sua cultura e verificar o potencial de uso sustentável destas plantas, bem como os possíveis impactos desses usos.
Ao longo dessas assembleias muitas propostas foram trabalhadas e, no momento, duas foram as escolhidas para implantação. A primeira é a construção uma trilha de plantas medicinais, voltada para o uso turístico. Muitos moradores são monitores de turismo no parque e a criação dessa trilha envolve o uso dos conhecimentos locais e a parceria direta com os botânicos do projeto e um especialista em trilhas. “Nós sugerimos que ao final da trilha pudéssemos cair em uma loja de artesanato e nessa loja teriam sabonetes com as plantas medicinais locais, específicas da mata atlântica, pomadas e velas repelentes, por exemplo”, conta Rodrigues.
A segunda proposta é a definição de um plano de manejo da Taboa, material muito utilizado para o artesanato local. E, sendo uma comunidade moradora de uma área dentro de Unidade de Conservação, o plano de manejo é essencial e necessário para que esses artesanatos possam ser vendidos legalmente pela comunidade. Mesmo a Taboa considerada uma espécie “invasora” com ampla distribuição geográfica no Brasil, os pesquisadores estão estudando os impactos e a necessidade de fazer esse plano de manejo legalmente dentro da Unidade de Conservação e estudando as possibilidades para a sustentabilidade econômica e biológica da espécie.
“A proposta toda se fundamenta no conceito de desenvolvimento local com responsabilidade ambiental”, explica Rodrigues, “e tem como base o envolvimento ativo dos moradores, o fortalecimento da comunidade local e o empoderamento para a tomada de decisões a respeito do uso de recursos”. A proposta da pesquisa envolve, também, a construção de um Índice de Prioridade de Conservação (IPC) que envolve tanto a parte de conservação biológica das espécies vegetais como os aspectos humanos e é parte essencial na construção dos planos de manejo das espécies que serão utilizadas.
Eliana Rodrigues explica que “o IPC é uma fórmula matemática, um índice da ecologia, que envolve a somatória de vários conhecimentos sobre as plantas e serve para avaliarmos se é possível a utilização das plantas escolhidas e de que forma. É um instrumento base para o decisão sobre o uso de recursos por parte da comunidade”.
O IPC leva em conta a densidade dessa planta nas parcelas feitas nas áreas de uso dos quilombolas e em áreas de não uso, para comparação (fitossociologia), que parte dessa planta é utilizada (o uso da raiz tem peso diferente do uso das folhas, por exemplo, já que para utilizar a raiz a planta é totalmente extraída do ambiente), quantas pessoas, entre os utilizadores/entrevistadores, utilizam essa planta (avalia a pressão de uso) e para quantas finalidades essa planta é utilizada (também avalia a pressão de uso).
Eliana Rodrigues explica que “o IPC é uma fórmula matemática, um índice da ecologia, que envolve a somatória de vários conhecimentos sobre as plantas e serve para avaliarmos se é possível a utilização das plantas escolhidas e de que forma. É um instrumento base para o decisão sobre o uso de recursos por parte da comunidade”.