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Oficinas capacitam produtores agroecológicos na zona sul da cidade de São Paulo

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Projeto tem como foco os “Guardiões de Parelheiros”, os agricultores provedores de serviços ambientais na região de mananciais da capital paulista

A região de Parelheiros, no sul da cidade de São Paulo, tem uma paisagem bastante diferente da selva de pedra comumente associada à capital. Com unidades de conservação, áreas de proteção ambiental para a Mata Atlântica e parques lineares e urbanos, a região é considerada fundamental para a produção de água e de alimentos para o município. Em 2022, a Prefeitura de São Paulo lançou o Programa de Pagamento por Prestação de Serviços Ambientais (PSA) em Áreas de Proteção aos Mananciais do Município de São Paulo voltado a proprietários e agricultores familiares que habitam essas áreas. O projeto Guardião de Parelheiros, parte do Biota/Fapesp, pretende acompanhar, apoiar, analisar e avaliar de forma participativa a implementação desse PSA.

Para Renato Cymbalista, professor da FAU-USP e coordenador do projeto, “em nenhum outro lugar do mundo há esse encontro de uma metrópole deste tamanho com um espaço de biodiversidade tão grande. Esse PSA faz parte de uma série de políticas públicas que olha pela primeira vez, para essa região com esse olhar diferenciado”. A pesquisa se estrutura a partir da parceria entre a Universidade de São Paulo, como instituição de pesquisa e extensão; o Fundo Agroecológico, uma ONG que articula e apoia os pequenos agricultores locais; a Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente (SVMA), gestora do programa PSA Mananciais; e os próprios agricultores provedores de serviços ambientais, beneficiários do programa.

Oficinas realizadas na região de Parelheiros, em São Paulo (SP). Fotos: Maurizio Pioletti e Divulgação projeto Guardões de Parelheiros.

O programa de PSA Mananciais da cidade de São Paulo tem algumas peculiaridades que o tornam um modelo de referência municipal, explica Maurizio Pioletti, pesquisador de pós doutorado do mesmo projeto. “Esse PSA não apenas premia os possuidores de terra para manter a floresta em pé através do trabalho já realizado de manutenção agroecológica dos sítios, mas também incentiva diretamente um conjunto de ações a serem realizadas ao longo do ciclo de pagamento. Elas miram o restauro das Áreas de Proteção Permanente demarcadas pela presença dos mananciais, a regularização da captação de águas nos sítios rurais e operação de transição agroecológica das produções de pequena escala. Tudo isso significa conciliar a presença da Mata Atlântica com as produções locais”, aponta o pesquisador.

Foi a partir do diálogo direto com os agricultores que, no início de 2025, os pesquisadores mapearam um conjunto de assuntos específicos e necessidades de conhecimento técnico do grupo para a implementação do PSA. “É preciso trabalhar a partir da escuta e do reconhecimento dessas pessoas, de compreender como elas vivem e se constróem”, ressalta Renato Cymbalista, “são pessoas que, como todos nós, precisam de tempo, de dinheiro, de reconhecimento, de segurança. Por isso, é importante ancorar os projetos nas demandas e sonhos desses agricultores, e não o contrário”. Desse diagnóstico participativo, emergiram cinco eixos temáticos, que se transformaram em cursos práticos realizados ao longo de 2025 nas propriedades rurais de Parelheiros.

O primeiro tema foi a identificação de espécies e sinalização pedagógica das mesmas, trabalhado por meio de informações sobre classificação de famílias botânicas e o uso do aplicativo PlantNet, que ajuda na identificação de plantas por meio de fotografias. Essa demanda tem relação direta com o turismo rural, especialmente de visitas escolares às propriedades. “Uma trilha de árvores bem sinalizada auxilia a transformar uma visita rápida em uma longa, que pode envolver outras atividades como um almoço, por exemplo, e isso resulta em renda extra para o agricultor”, explica Renato Cymbalista.

A meliponicultura foi a temática abordada na oficina conduzida pelo Bruno Rocha da Silva, da SVMA, com o objetivo de capacitar os agricultores participantes do PSA no conhecimento e manejo de abelhas nativas sem ferrão. Além da parte teórica que incluiu temas como a biologia das abelhas nativas, planejamento técnico e financeiro de um meliponário e as principais normas legais que regem essa atividade, os agricultores tiveram uma etapa prática na qual puderam aprender sobre alimentação complementar, manejo preventivo, noções de divisão de colônias e manutenção de caixas. Também foi realizada uma visita a uma propriedade local para aplicação dos conhecimentos adquiridos em campo e análise de situações reais de organização e infraestrutura de meliponários. “A difusão dos meliponários é fundamental para garantir a permanência das abelhas sem ferrão na região e a polinização das plantas nativas, processo necessário para a regeneração geral do bioma”, salienta Maurizio Pioletti.

Oficinas realizadas na região de Parelheiros, em São Paulo (SP). Fotos: Maurizio Piolett.

O cultivo em nível, a cobertura permanente do solo e outras práticas de conservação do solo foram as questões da terceira oficina, conduzida pela agrônoma Roseli Allemann da SVMA. Estratégias como a realização de curvas de nível, traçadas em um exercício prático com pés de galinhas, a cobertura permanente do solo e a recuperação de matas ciliares foram discutidas como respostas concretas ao problema de perda de solo e nutrientes causada pela lavagem da terra causada pelo fluxo inadequado de águas pluviais dentro do sítio. A oficina reforçou que a saúde do solo é a base para a produtividade agroecológica e a sustentabilidade ambiental das propriedades.

A quarta temática foi o mapeamento territorial por meio de drones, com aulas sobre os diferentes tipos e usos desses equipamentos, legislação e um exercício prático de pilotagem. Também foi abordado o processamento das imagens e seu potencial para o geoprocessamento, mostrando que estes podem ser grandes facilitadores e aliados no planejamento rural. Maurizio Pioletti destaca que o levantamento por drone hoje é fundamental para realizar um monitoramento contínuo das mudanças de uso e ocupação do solo, frente a projetos de reflorestamento, de instalação de sistemas agroflorestais e de conversão da agricultura tradicional para o cultivo agroecológico. “Além disso, o levantamento por drone permite evidenciar eventuais invasões ilegais da terra e atividades criminosas como desmatamento não autorizado”, ressalta o pesquisador.

E, por fim, um curso sobre saneamento rural, conduzido pela engenheira Annelise Picolo, capacitou os participantes em soluções de tratamento de esgoto doméstico para pequenas propriedades rurais. Os participantes construíram um vermifiltro, uma solução baseada na natureza que usa minhocas para tratamento do efluente de vasos sanitários, além de conhecerem outras tecnologias sociais existentes. Essa tecnologia foi escolhida entra as diversas opções promovidas pela própria SVMA nas regiões rurais pela compatibilidade com o sítio onde foi realizada a oficina. Para Maurizio Pioletti, “o problema do saneamento, devido à inadequação das infraestruturas para o tratamento do esgoto em geral nas cidades brasileiras, pode ser resolvido nos sítios rurais com tecnologias simples e econômicas diretamente pelos proprietários sem esperar a intervenção pública. Não atuar então seria perder uma ocasião de redução da imissão de agentes poluentes na biosfera”.

Próximos passos

O ciclo de capacitações se encerrou em 26 de novembro com um workshop de avaliação participativa do programa PSA Mananciais, reunindo os provedores participantes e os técnicos da Prefeitura no sítio RPPN Mata Virgem. O dia foi de apresentações e rodas de conversas para avaliar, de forma participativa, a implementação do programa de PSA depois de aproximadamente dois anos desde o início. Para Maurizio Pioletti, a conversa evidenciou a satisfação dos participantes que reconhecem a utilidade de receber o apoio financeiro para a transição agroecológica dos sítios. “Ao mesmo tempo, observamos algumas dificuldades de tipo administrativo, pelo conjunto de documentos necessários, e de tipo técnico, pela realização prática de algumas ações. Frente a estas dificuldades, para o futuro, delineia-se a necessidade de uma maior assistência técnica diretamente nos sítios”, conclui o pesquisador.

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