Relatório do IPBES, direcionado aos formuladores de políticas públicas, apresenta os principais achados sobre as consequências da extinção de polinizadores.
“É um momento histórico”, assim definiu Dr. Carlos Joly, membro do Multidisciplinary Expert Panel (MEP/IPBES) e coordenador do Programa Biota/Fapesp. Após 2 anos de aprovado, o Programa de Trabalho (2a Plenária IPBES, Antalya/Turquia, dezembro 2013) da Plataforma Intergovernamental de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos lançou seu 1º produto: o Diagnóstico Global de Polinização e Polinizadores Associados à Produção de Alimentos. Além do conhecimento científico, o trabalho incorpora também os conhecimentos tradicionais e indígenas. Junto com o relatório com mais de 300 páginas, os pesquisadores prepararam também um Sumário para Tomadores de Decisão, cujo texto foi discutido, revisado acaba de ser aprovado pelos 124 países que participam da 4ª Plenária do IPBES que aconteceu em Kuala Lumur (Malásia) no final de fevereiro.
Dentre os principais destaques, o relatório afirma que a polinização por animais desempenha um papel vital como um serviço de regulação do ecossistema na natureza. De maneira mais concreta, isto pode ser visualizado por meio das culturas agrícolas. Estima-se que o volume de produção de culturas agrícolas que dependem de polinizadores aumentou em 300% nas últimas cinco décadas, o que tornou nossas culturas agrícolas mais dependentes do processo de polinização. Hoje, considera-se que mais de três quartos dos principais tipos de culturas alimentares globais dependem em certa medida da polinização animal para a garantir volume e qualidade da produção. Por esta perspectiva, calcula-se que 5-8% da produção agrícola global atual pode ser atribuída diretamente à polinização animal totalizando de US$235 bilhões a US$577 bilhões por ano.
O ponto é que a grande maioria das espécies de polinizadores são selvagens, incluindo mais de 20.000 espécies de abelhas, e algumas espécies de moscas, borboletas, mariposas, vespas, besouros, pássaros e morcegos, e outros vertebrados.
Além dos polinizadores serem uma fonte de múltiplos benefícios para as pessoas – com destaque na provisão de alimentos – estas espécies igualmente contribuem na indústria de medicamentos, biocombustíveis (por exemplo, canola, óleo de palma), fibras (por exemplo, algodão, linho) materiais de construção (madeira), instrumentos musicais, artes e ofícios, recreativos atividades e como fontes de inspiração para a arte, música, literatura, religião, tradições, tecnologia e educação.
De acordo com a Lista Vermelha da IUCN, 16,5% dos polinizadores vertebrados estão ameaçadas de extinção global (aumentando para 30% espécies insulares). Não há avaliações globais Lista Vermelha especificamente para insetos polinizadores. No entanto, as avaliações regionais e nacionais indicam altos níveis de ameaça para algumas abelhas e borboletas.
Uma série de características de práticas agrícolas intensivas atuais ameaçam polinizadores e a polinização. Os pesticidas, por exemplo, em decorrência de uma combinação da toxicidade e do nível de exposição, têm uma ampla gama de efeitos letais e sub-letais em polinizadores, segundo estudos realizados em condições experimentais controladas. Uma alternativa discutida é a diminuição da exposição de polinizadores aos pesticidas por meio: (i) da redução do uso de pesticidas; (ii) buscando-se formas alternativas de controle de pragas, e (iii) desenvolver novas tecnologias. Ao lado disso, essas ações devem incluir a promoção do Manejo Integrado de Pragas que incorpore a capacitação de agricultores, a promoção de agricultura orgânica e políticas para reduzir o uso geral destas substâncias.
No tocante aos Organismos Geneticamente Modificados (OGM), o Relatório aponta que, pelo fato destes organismos serem tolerantes a herbicidas ou resistentes a insetos, ocorre a redução das populações de plantas daninhas, portanto, a diminuição dos recursos alimentares para polinizadores. As consequências reais na abundância e na diversidade de polinizadores em campos de organismos tolerantes a herbicidas são desconhecidos. Já nas culturas de OGM resistentes a insetos pode resultar na redução da utilização de inseticidas, que varia regionalmente de acordo com a prevalência de pragas. Se sustentada, esta redução no uso de inseticidas poderia reduzir esta pressão sobre insetos não-alvo. Entretanto estes impactos também são desconhecidos. As avaliações de riscos exigidas para a aprovação de culturas de OGM na maioria dos países não aborda adequadamente os efeitos sub-letais diretos e indiretos de culturas de OGMs, em parte devido à falta de dados.
A transição para práticas agrícolas mais sustentáveis, na qual se valoriza a diversificação de paisagens, pode ser um caminho promissor para inverter os riscos associados com o declínio dos polinizadores. Neste sentido, práticas baseadas em conhecimento tradicional em parceria com a pesquisa científica podem ser uma rica fonte de soluções para os desafios atuais.
O processo de elaboração do documento foi coordenado ao longo dos últimos dois anos pelo britânico Simon G. Potts, professor da Universidade de Readings (Reino Unido), e pela brasileira Vera Lucia Imperatriz Fonseca, professora do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo e membro do Programa Biota/Fapesp. Conheça mais sobre o trabalho do Thematic assessment of pollinators, pollination and food production.