Scroll Top

Espécies exóticas invasoras causam danos à biodiversidade, à saúde e prejuízos bilionários

imagem

Relatório produzido por pesquisadores brasileiros apresenta os principais impactos causados por espécies invasoras e aponta caminhos para prevenção e mitigação

Em estudo inédito recém-lançado, a Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES) aponta a existência de mais de 500 espécies exóticas invasoras (EEIs) espalhadas por todas as regiões e biomas do Brasil. Plantas terrestres (198 espécies) e peixes (126 espécies) aparecem em maior quantidade. Entre as mais conhecidas estão tilápia, carpa, cavalos, cães e gatos domésticos, pinheiro-americano, eucalipto e o mosquito-da-dengue.

As principais causas da introdução de espécies exóticas invasoras estão relacionadas a atividades humanas, como o comércio de animais de estimação e de plantas ornamentais e hortícolas, por este motivo os registros são mais numerosos em ambientes degradados ou de alta circulação. Ainda assim, unidades de conservação não estão imunes às invasões: 30% delas já possuem indivíduos invasores em seus territórios.

As invasões biológicas, principalmente de espécies introduzidas intencionalmente e para uso econômico, geram graves impactos, afetando saúde, economia e atividades socioculturais. Como ponderou Márcio Luis Orsi, professor da Universidade Estadual de Londrina (UEL) e coordenador do Relatório: “Embora os benefícios da introdução intencional de espécies sejam, muitas vezes, restritos a grupos específicos, os prejuízos são compartilhados por toda a sociedade”. A estimativa do estudo é de que, entre 1984 e 2019, os danos causados por apenas 16 espécies exóticas invasoras levaram a prejuízos de 77 a 105 bilhões de dólares devido a consequências como a perda de produção e de horas de trabalho, internações hospitalares e interferência na indústria de turismo. As principais EEIs relacionadas à essa perda bilionária foram pragas agrícolas e silviculturais (28 bilhões de dólares) e vetores de doenças (11 bilhões de dólares).

Para prevenir e controlar essas invasões, mitigando seus efeitos negativos, são necessárias ações estratégicas imediatas e agilidade na tomada de decisões. A prevenção é a opção de manejo de melhor relação custo-benefício, seguida de detecção precoce e resposta rápida. Neste sentido, estratégias que envolvem vigilância, monitoramento e participação social tornam as ações contra invasões biológicas mais eficazes. “Esse problema não é exclusivo do governo ou das empresas. Cada cidadão e cidadã tem um papel nisso”, ressalta Michele Dechoum, professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e coordenadora do estudo. “A escolha de uma planta para o seu jardim, já é uma coisa importante. Se as pessoas usam menos espécie exóticas invasoras, teremos menos dessas espécies em nosso território e, consequentemente, uma menor chance de elas chegarem em ambientes naturais”.

Os pesquisadores acreditam que a disseminação de conhecimento sobre EEIs e seus impactos pode reduzir a resistência da população ao controle de espécies consideradas carismáticas, como cães e gatos, árvores ornamentais e algumas espécies de tartaruga e primatas. A professora Helena Borgallo, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, co-autora do Relatório, aponta a importância da guarda responsável de espécies domésticas: “Ela é necessária especialmente nas áreas rurais, onde os animais vivem soltos. Hoje, os cachorros domésticos são, na maioria das unidades de conservação, os carnívoros mais frequentes”, explica. O abandono de animais de estimação como cães, gatos e peixes, é um importante via de introdução de espécies exóticas invasoras.

Ecossistema Marinho – Entre 2009 e 2019, os registros de espécies exóticas invasoras marinhas cresceram 25%, com uma taxa de cerca de três novas espécies por ano, sendo a maioria observada na zona bentônica, associada ao substrato marinho. De acordo com a pesquisadora Andrea Junqueira, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenadora do Relatório, a previsão é de que aumente ainda mais.

O ambiente marinho impõe dificuldades para a detecção, manejo e controle de espécies invasoras. “Precisamos usar de subterfúgios para estar naquele ambiente e conseguir fazer o controle. Muitas vezes, a única forma é através do mergulho, então é necessário ter uma capacitação prévia. É muito mais difícil do que no ambiente terrestre”, explica Adriana Carvalhal, pesquisadora do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e co-autora do estudo.

Nesse momento, as espécies mais problemáticas no ecossistema marinho brasileiro são o coral-sol, cujos primeiros registros ocorreram nos anos 80, e o peixe-leão, que é observado no território brasileiro desde 2020. Estas, também, são as primeiras espécies para as quais foram desenvolvidos programas de manejo específicos, com ações mais estruturadas ao longo da costa.

As espécies de coral-sol estão entre os invasores marinhos mais bem estudados, com impactos identificados e descritos na costa brasileira. Mesmo com o conhecimento de que ocasionam mudanças na estrutura e diversidade das comunidades dos ambientes invadidos podendo, inclusive, impactar o cultivo de outras espécies, como o mexilhão, ainda não há estudos indicando a valoração econômica desses impactos.

Outro aspecto particular deste ecossistema é a interferência de grandes embarcações na fauna e flora marinhas. As plataformas de petróleo e os grandes navios que operam no comércio exterior são importantes vetores de EEIs. “Ainda não existe uma regra global para o controle de bioincrustação de mexilhões, por exemplo, que ocorre em plataformas e cascos de navio. Já em relação à água de lastro, existe uma convenção feita pela Organização Marítima Internacional, ligada à ONU, que determinou a obrigatoriedade de um tratamento dessa água para grande parte dos navios”, detalha Andrea. “Uma coisa interessante em relação à questão de comércio exterior, é que precisamos de convenções diplomáticas. A espécie exótica não atende a limites políticos. Se um país é extremamente cuidadoso dentro do seu território, mas o país vizinho está todo invadido, não adianta, porque a espécie vai se dispersar”, finaliza.

O “Relatório Temático sobre Espécies Exóticas Invasoras, Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos” apresenta uma síntese das principais pesquisas sobre o tema no país. Além do documento completo, também está disponível um Sumário para Tomadores de Decisão que apresenta os principais achados do relatório em textos complementarem de linguagem acessível e infográficos didáticos. Com este trabalho os pesquisadores esperam auxiliar gestores e lideranças governamentais e empresariais na tomada de decisão acerca da prevenção e do controle das invasões biológicas no território nacional.

Posts relacionados