Resultados vão subsidiar manejo florestal na FLONA de Capão Bonito
A conservação da biodiversidade tem sido, cada vez mais, movimentada pela construção coletiva de soluções. Esse caminho de enfrentamento aos desafios ambientais exige o envolvimento de diferentes atores sociais, como pesquisadores, gestores de unidades de conservação e população local. Para formar profissionais capazes de atuar nesse contexto, é necessário ir além do conhecimento puramente teórico, proporcionando a vivência dessas relações complexas. O curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal de São Carlos, campus Lagoa do Sino, tem buscado transformar a formação profissional de seus estudantes a partir da integração entre a infraestrutura instalada para pesquisas e a demanda concreta da sociedade para a resolução de problemas reais de conservação.
“Nosso curso tem como foco a formação em Biologia da Conservação e, para isso, construímos um currículo organizado em eixos temáticos e com uma proposta de avaliação integradora que consiste na aplicação do conteúdo do ano letivo na solução de um problema prático”, explica Alexandre Martensen, professor da instituição e coordenador do projeto “GoFor – Governança da transição florestal na Mata Atlântica: aumentando nosso conhecimento sobre a recuperação florestal e os serviços ecossistêmicos”, vinculado ao Programa Biota/Fapesp.
Entre 2024 e 2025 os estudantes trabalharam a partir da demanda apresentada pela gestora da Floresta Nacional de Capão Bonito (SP), Beatriz Beisiegel. A FLONA de Capão Bonito foi criada em 1944 para plantio de Araucária que era, na época, um dos principais produtos de exportação do Brasil. Na década de 1960 começaram os plantios dos talhões de Pinus. Hoje, a Unidade possui cerca de mil hectares de Araucárias, já com processos avançados de regeneração florestal e 3 mil hectares de pinus. Em 2023 a FLONA foi integrada ao Plano Anual de Outorga Florestal (PAOF), que indica florestas passíveis de concessão para a extração de produtos e exploração de serviços por meio do manejo florestal sustentável. O foco principal da concessão prevista no PAOF são os talhões de pinus.
Neste contexto, a UFSCar começou a fazer os estudos de viabilidade econômica e de sustentabilidade para indicar os espaços possíveis de serem explorados e as contrapartidas necessárias para garantir a conservação de áreas de maior importância para a conservação ambiental. Dentro desse processo está a necessidade de compreender melhor qual a distribuição do mico-leão-preto na área. “Nós sabemos que a FLONA é uma das áreas mais importantes para a conservação do mico-leão-preto, já tínhamos dados de uma pesquisa realizada anteriormente que encontrou os micos em algumas áreas, mas na época nós tínhamos diversas atividades econômicas acontecendo dentro da FLONA e cerca de 200 pessoas moravam aqui. A partir de 2005 isso mudou completamente e percebemos que os micos passaram a ocupar uma região muito maior, mas não sabíamos exatamente quais eram esses espaços”, explica Beatriz Beisiegel.

E foi essa necessidade de mapeamento que foi apresentada como o problema real a ser enfrentado pelos estudantes de Lagoa do Sino. A pesquisa coordenada por Martensen já utiliza gravadores e sequenciamento de DNA Ambiental para avaliar a diversidade de espécies presentes em um local. E essa infraestrutura foi colocada à disposição dos estudantes para o desenvolvimento do projeto. O pesquisador acrescenta que “os alunos definiram o desenho experimental, foram a campo para instalar os gravadores em 44 pontos, coletaram amostras para avaliação de DNA ambiental e analisaram os dados coletados”. As viagens de campo tiveram, também, o apoio da própria Universidade e do ICMBio.
Entre os resultados das gravações e das análises de DNA ambiental, o mico-leão-preto foi identificado em 10 pontos, ou cerca de 23% dos locais amostrados, um número considerado expressivo pelos professores que orientaram o trabalho. Entre os locais registrados estavam diversos pontos dentro dos talhões de pinus, mostrando que o mico-leão-preto também utiliza esses locais. Esses dados obtidos pelos estudantes têm aplicação imediata na geração de um documento detalhado que irá auxiliar diretamente na construção do plano de manejo da FLONA e no edital de concessão. “Nossa proposta é incluir medidas de conservação do mico-leão-preto a partir desses dados, para que as áreas realmente utilizadas pelos animais não possam ser retiradas”, enfatiza Beatriz Beisiegel.
Para além de auxiliar a compor um documento dessa importância, as atividades têm um grande impacto no amadurecimento e no trabalho das habilidades dos estudantes para além dos conteúdos. “Os estudantes aprendem coisas mais sutis ao estarem em contato direto e constante com os gestores, como a linguagem e a dinâmica da gestão de uma área, como é lidar com os diferentes atores envolvidos e que tipo de problemas a gestão enfrenta. Acho que esse é o nosso diferencial e, também, o ganho principal deste tipo de projeto”, avalia Vinícius de Avelar São Pedro, professor da UFSCar e participante do projeto.
Para o estudante Caio Bueno Lopes, as atividades são complexas, demandam muita energia, mas são muito positivas, “nós participamos de um processo científico completo, conseguimos entender na prática o trabalho de um biólogo porque ao longo do projeto nós atuamos como um profissional de campo na coleta de dados, um analista trabalhando com estatística e alguém que redige textos científicos”. O estudante ainda ressalta a empolgação de todos os envolvidos ao analisar os dados coletados, “foi muito bom ver que nós conseguimos mapear esses animais e que nosso trabalho está contribuindo para algo importante”.
“A parceria com a universidade é fundamental, a FLONA busca ser um laboratório a céu aberto e a pesquisa dos estudantes respondeu a uma necessidade urgente da gestão. Além disso, como resultado direto dessa interação, dez alunos já passaram a fazer estágio formal na FLONA, fortalecendo a relação entre a universidade e a unidade de conservação e enraizando o conhecimento na região”, conclui Beatriz Beisiegel.















