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Giaia divulga análise da qualidade das águas e continua em busca de pesquisadores em Ictiologia

Relatório traz análise da qualidade da água das coletas realizadas em dezembro/2015 e abril/2016 e lança novos desafios para a compreensão das consequências do rompimento da barragem para a Bacia do Rio Doce.

Aspecto das margens do Rio Doce em dezembro de 2015. Foto: Dante Pavan.
Aspecto das margens do Rio Doce em dezembro de 2015. Foto: Dante Pavan.

O Grupo Independente de Avaliação de Impacto Ambiental (GIAIA) – grupo de pesquisadores que busca avaliar a situação da Bacia do Rio Doce após o rompimento da barragem de dejetos de mineração da empresa Samarco, em Marina/MG – divulga o relatório de de quantificação de metais na água da bacia a partir de coletas realizadas em dezembro/2015 (logo após o rompimento) e abril/2016.
Formado por pesquisadores de diferentes instituições brasileiras e contanto com o apoio de uma campanha de financiamento coletivo, o GIAIA organiza coletas, análises e disponibiliza os resultados de forma acessível à população atingida pelo rompimento da barragem e cidadãos interessados em acompanhar a situação da Bacia do Rio Doce (veja as notícias já publicadas na página do Biota: Que tal colocar sua experiência a serviço da Bacia do Rio Doce? e GIAIA organiza nova coleta na área de recursos hídricos e ecologia aquática).
O relatório trouxe resultados das duas últimas pesquisas de campo, comparando as amostras obtidas em dezembro/2015 e abril/2016. Segundo Flávia Bottino, pesquisadora da UFSCar e participante do GIAIA, houve uma certa melhora na qualidade da água neste período com relação aos metais, pois há pouca quantidade de água no Rio Doce devida à falta de chuva. “A falta de chuva e a diminuição da vazão do Rio Doce faz com que o rejeito depositado nas margens não seja levado para o leito do rio, faz também com que os sedimentos particulados e mais pesados se depositem no fundo do leito do rio, o que diminui a diluição desses metais na água e favorece essa melhoria observada”.
A turbidez (que se deve à presença de materiais suspensos na água que dificultam a passagem da luz) estava maior que 10 mil UNT (unidade nefelométrica de turbidez) em dezembro/2015 e, em abril/2016 estava em torno de 400. Como parâmetro de comparação, é importante ressaltar que antes do acidente a turbidez girava em torno de 40 a 50, segundo dados encontrados na literatura. Embora ainda continue alta em comparação com os dados anteriores ao acidente, a grande diminuição na turbidez acontece pelos mesmos fatores indicados anteriormente: não há entrada de lama e metais na água porque não há chuva lavando as margens. “Não sabemos o que pode acontecer se chover muito”, diz Flávia Bottino, “provavelmente os índices de qualidade de água deverão piorar novamente quando a chuva vier. Estamos, portanto, num paradoxo: por causa dessa escassez de chuva, o Rio Doce está com uma lâmina d’água de 20 centímetros em alguns locais, isso significa que precisa chover. Mas se chover vai carregar a lama das margens para o rio”. E um aumento na turbidez das águas impacta o crescimento das algas e, como consequência, toda a biodiversidade associada.
Os dados de abril mostram que há, ainda, uma grande quantidade de ferro nas águas. “A legislação não prevê níveis máximos de ferro total na água doce, mas sabemos que isso tem conseqüências a longo prazo para as pessoas e para a biodiversidade” explica Flávia Bottino.
Com relação à saúde da população, a água não é apta para consumo na forma bruta, diretamente do rio, em nenhum dos pontos estudados. Já os dados de água tratada da cidade de Governador Valadares não apresentam metais pesados e podem ser consumidos normalmente. A grande preocupação vem do poços artesianos usados em comunidades rurais como em Regência, por exemplo. Nesses poços a quantidade de alumínio é 3 vezes maior que o permitido, a de manganês 5 vezes maior e a de ferro, cerca de 1140 vezes acima do permitido. O retorno desses dados à população traz impactos imediatos já que a intoxicação por ferro pode resultar em casos de gastrite grave, com vômitos, hemorragia e diarreia e a intoxicação crônica está relacionada à progressão de doenças neurodegenerativas.
Já com relação à conservação da biodiversidade, o ferro, em água doce, é considerado como elemento traço e está realcionado com a fisiologia dos organismos. Em pequenas concentrações, é importante porque participa de processos fisiológicos como a cadeia respiratória, mas a equipe do GIAIA ainda estuda os possíveis impactos do ferro em grandes concentrações na água doce. O que se sabe é que o ferro na forma dissolvida aumenta a turbidez da água e, consequentemente, impacta a bidoversidade, como já dito. Mas o ferro, assim como outros metais, não permanecem na forma dissolvida por muito tempo e na forma particulada precipitam no fundo e o impacto da presença do ferro e outros metais no fundo do rio é algo ainda em aberto para estudos e análises de impacto.
Este é mais um capítulo em uma história longa, que não começa no rompimento da barragem, embora tenha se transformado em catástrofe a partir daí. A Bacia do Rio do Doce já estava comprometida com o uso antrópico antes e o rompimento da barragem foi um final trágico para usos não sustentáveis das águas. Ou, talvez, um novo recomeço. “Algumas pessoas veem essa tragédia como uma forma de aviso extremo sobre a forma de uso dos rios. E há um profundo impacto em todas as pessoas que usam o rio de alguma forma, da pesca de subsistência à retirada de areia” sublinha Flávia Bottino, “ninguém sabe muito bem o que fazer, por isso o envolvimento dos cientistas de uma maneira aberta e com amplo diálogo com a população é tão importante. Recuperar uma bacia, exige um envolvimento de mais do que um estado, de mais do que uma comunidade, de mais do que apenas um grupo de pesquisadores, é um movimento muito maior que precisa ser feito”.
Flávia Bottino ressalta que a verba é limitada e a proposta do GIAIA não é financiar pesquisas como uma agência de fomento, mas diárias de campo e material de consumo podem ser pagos com o dinheiro do financiamento coletivo. “A contrapartida são os dados abertos e em uma velocidade mais rápida. Precisamos de dados gerais, que possibilitem à população compreender se podem consumir a água e consumir os peixes que ainda resistem na área. A publicação científica, o artigo, com detalhamento pode vir depois, apenas com um agradecimento ao Giaia”.

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Pesquisadores da área de Ictiologia para organização de coletas na região, análise dos dados coletados e/ou organização de dados históricos da literatura[/message_box]

Dada a magnitude dos impactos na Bacia do Rio Doce, a Capes lançou um edital, aberto até o dia 20 de junho, para projetos com o objetivo de “geração de conhecimento, tecnologias e processos tendo como objetivo a Recuperação da Bacia Hidrográfica do Rio Doce e ecossistemas associados”. Os detalhes do edital podem ser encontrado no site da Capes: https://www.capes.gov.br/sala-de-imprensa/noticias/7888-edital-apoia-redes-de-pesquisa-para-recuperacao-da-bacia-do-rio-doce

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