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Homens e macacos no sertão

Projeto EthoCebus aposta na união entre pesquisa, divulgação e educação para a conservação da diversidade biológica e cultural no semiárido.

O uso de ferramentas por macacos prego é um comportamento bastante estudado e observado em cativeiro. Desde 2005, no projeto EthoCebus – tecnologia e tradições dos macacos prego, pesquisadores acompanham e estudam esse comportamento em grupos de macacos livres na região do semiárido do sul do estado do Piauí. E são os resultados desta pesquisa aliados a um trabalho de divulgação e educação com a comunidade que reside nas proximidades da área habitada pelos macacos-prego que compõem o documentário “Homens e macacos-prego no sertão. Conhecendo e valorizando o semiárido brasileiro para preservar um ecossistema em perigo”.

“Tudo começou quando um fotógrafo publicou uma foto de um macaco-prego quebrando cocos com ferramentas numa revista sobre vida selvagem da Inglaterra” conta Noemi Spagnoletti, pesquisadora responsável pela direção do documentário. O uso de ferramentas por macacos prego não era uma novidade para os cientistas que estudavam os animais em cativeiro, no entanto, não haviam registros desse comportamento na natureza. E foi isso que chamou a atenção das pesquisadoras Dorothy Fragaszy (University of Athens, Georgia, USA), Elisabetta Visalberghi (Istituto di Scienze e Tecnologie della Cognizione del CNR di Roma, Italia), e Patrícia Izar (Departamento de Psicologia Experimental, USP) que organizaram uma expedição ao local indicado (uma Reserva Particular ao sul do Piauí) e decidiram fundar o projeto EthoCebus.

Desde o doutorado Noemi estuda a distribuição do uso de ferramentas pelos macacos-prego, em especial o uso das bigornas, uma pedra ou madeira grande para onde os animais carregam suas ferramentas para abrir os cocos. Neste projeto da modalidade “jovem pesquisador”, Noemi incluiu o estudo e avaliação sobre o conhecimento das pessoas que moram nas comunidades locais a respeito dos macacos-prego e seu comportamento de uso de ferramentas e o impacto de sua presença nas lavouras de milho dos moradores.

“Ao longo desse tempo de pesquisa surgiram outras necessidades, como o documentário de divulgação de nosso trabalho de pesquisa”, explica Noemi, “nós sempre recebemos muitas equipes de TV para filmar os macacos-prego mas sentíamos falta dos detalhes sobre a pesquisa. Além disso, eu conversei com cerca de 80% da comunidade e as pessoas não sabiam muito bem o que fazíamos ali, mesmo depois de 10 anos de pesquisa. É importante termos como alvo a comunidade internacional, mas é importante que eles, que acabam sendo os protetores desses local, também saibam o que fazemos”.

O vídeo completo está, no momento, passando e festivais de documentários ambientais, enquanto isso, dois trailers estão disponíveis online: http://www.youtube.com/watch?v=fvUl6lqxV8s  http://vimeo.com/132752681 e  http://www.youtube.com/watch?v=Tf4RwMu-7-8.

Desde o início do projeto EthoCebus os pesquisadores trabalham com o auxílio de assistentes, moradores locais que passaram por treinamento para auxiliar na coleta de dados. “O projeto só nasceu porque tinham moradores locais que conheciam os macacos muito bem. Um deles, inclusive, é o professor local e dono da área de reserva privada que estudamos. Sem a presença deles do nosso lado, para coleta de dados, acompanhamento das coletas, o conhecimento deles sobre os lugares, a Serra, os macacos, o projeto não aconteceria tão bem” explica Noemi. Ao longo do tempo o trabalho de assistência aos pesquisadores virou um serviço frequente para alguns moradores, que trabalham para o projeto e mantém suas atividades anteriores como a lavoura. Além disso, essas pessoas passaram a compreender a necessidade de conservação do local e agem como multiplicadores desse conhecimento.

Ainda dentro deste trabalho, Noemi produziu um outro vídeo, de menor duração, destinado à comunidade local e, entre maio e junho deste ano de 2015, o utilizou num trabalho educativo que durou 5 semanas entre escolas da região. Neste trabalho foram os auxiliares de pesquisa que levaram as crianças aos locais de observação dos macacos-prego. “Todos ficaram muito felizes e impressionados dizendo que nunca tinham visto os animais tão de perto e isso é muito importante porque o objetivo final disso tudo é preservar a biodiversidade cultural seja dos macacos-prego, seja das pessoas”, afirma Noemi.

O projeto caminha com outras ações de conservação como a promoção da economia familiar, considerada um um modelo que favorece uma relação positiva com os animais silvestres (especialmente pássaros e macacos-prego). Segundo os estudos de Noemi, o impacto dos animais nas lavouras pode chegar a cerca de 20% mas isso que não impacta a capacidade do pequeno agricultor de viver dessa lavoura “O uso dos recursos de uma forma sustentável é valioso para ambos, não prejudica ninguém. Em áreas com grandes plantio de monocultura, o impacto dos animais nas pequenas lavouras de alimentos é muito maior”, destaca Noemi, “e precisamos ficar atentos pois há o perigo do Piauí se transformar em uma grande área de plantio de soja. Próximo do nosso local de estudo, no ano passado (2014), em 15 dias foram desmatados 500/600 hectares, e o impacto foi imenso e sentido por todos: pesquisadores, moradores e macacos-prego”.

Dados do documentário:

 

Homens e macacos-prego no sertão. Conhecendo e valorizando o semiárido brasileiro para preservar um ecossistema em perigo.

São Paulo, 2015

 

PRODUÇÃO

Direção: Noemi Spagnoletti
Roteiro: Noemi Spagnoletti e Lucas Peternelli
Supervisão científica: Patrícia Izar
Tradução: Thais Moreno de Barros, Chiara Lucisano
Fotografia: Alessandro Albani, Elisabetta Visalberghi e Marino Junior Fonseca de Oliveira
Fotos: Luca Marino, Fernanda Cutrim, Lucas Peternelli, Adriane Suzin, Noemi Spagnoletti, Michele Iacono, Marino J. Fonseca de Oliveira
Montagem: David Borges e Alessandro Albani
Arte e Pós-produção: Ideia Animada Filmes
Narração: Lucy Mello
Trilha sonora: Lucas Peternelli e David Borges
Estúdio de Gravação: Cia Casa da Sogra

Imagens gentilmente cedidas por Elisabetta Visalberghi e Alessandro Albani do documentario “The Bearded Capuchin Monkeys of Fazenda Boa Vista”.

Apoio: Fundação de Ampara e Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo. Projeto BIOTA/FAPESP (2013/19219-2); CAPES (#17/2012). Fondazione Ethoikos.

Mais informações em: http://www.ip.usp.br/ethocebus/

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