Scroll Top

Quais podem ser os impactos dos eventos climáticos extremos nas florestas sul-americanas?

Eventos climáticos extremos estão cada vez mais frequentes. Apenas em 2023 podemos citar as chuvas torrenciais que levaram a grandes deslizamentos no Litoral Norte de São Paulo no início do ano e o registro de julho como o mês mais quente na história recente da humanidade. Se torna, portanto, cada vez mais importante compreender como as florestas tropicais respondem a esses eventos extremos. Em busca de respostas, pesquisadores analisaram 123 florestas da América do Sul para estimar o impacto do El Niño de 2015-2016 e concluem que condições excepcionalmente quentes e secas anulam a capacidade de absorção de carbono das florestas tropicais.

Foto: Simone Vieira.

Entre as florestas analisadas estão aquelas que são monitoradas a longo prazo por projetos vinculados ao programa biota, como o ECOFOR (biodiversidade e funcionamento de ecossistemas em áreas degradadas e em recuperação da Amazônia e Mata Atlântica), o Biota/Gradiente Funcional (composição florística, estrutura e dinâmica do funcionamento da Floresta Ombrófila densa Atlântica o Parque Estadual da Serra do Mar) e o PELD/BIOTA (Gradiente Funcional Da Floresta Ombrófila Densa Atlântica). Esses projetos instalaram e acompanham locais de monitoramento de longo prazo em um gradiente que vai de florestas intactas às que foram severamente alteradas na Amazônia e na Mata Atlântica. “A cada dois anos nós vamos a campo e reavaliamos os mesmos locais. Todos esses dados são depositados em um banco de dados internacional denominado ForestPlots e podem ser utilizados por pesquisadores do mundo inteiro para análises amplas e de longo prazo”, explica Carlos Joly (IB/Unicamp), um dos autores do artigo. Esses dados já serviram de subsídio para diversas análises sobre florestas tropicais (leia outras notícias aqui).

São esses registros diretos, árvore por árvore, que permitiram a análise realizada por Amy Bennett, da Universidade de Leeds/UK: “os registros mostraram que a maioria das florestas atuou como um sumidouro de carbono durante a maior parte dos últimos 30 anos, com o crescimento das árvores excedendo a mortalidade. Quando ocorreu o El Niño de 2015-2016, esse sumidouro foi desativado como consequência do aumento na mortalidade de árvores”.

O El Niño de 2015-16 foi o mais quente e provavelmente a seca mais extrema na América do Sul em pelo menos 50 anos. Houve altas temperaturas em toda a região neotropical acompanhadas de anomalias de seca, especialmente no sul e no leste da Amazônia. Das 123 parcelas estudadas, 119 delas registraram um aumento médio mensal de temperatura de 0,5 grau Celsius e 99 das parcelas também sofreram déficit de água. Ou seja, onde estava mais quente, também estava mais seco. Entretanto, a comparação dos resultados do artigo com os dois estudos sobre a seca na Amazônia sugere que a exposição repetida à seca não causou nenhuma perda de resistência da floresta intacta e, embora o El Niño de 2015-2016 tenha sido a seca mais quente de todos os tempos na Amazônia, não há evidências de que seus impactos tenham sido mais fortes do que os das secas anteriores.

No entanto, o El-Niño aumentou os riscos de mortalidade de todas as árvores sul-americanas. Os autores destacam, ainda, que as árvores de grande e médio porte são muito mais vulneráveis, e que as árvores com menor densidade de madeira também tiveram maior probabilidade de morrer durante o evento climático do que as de alta densidade.

Além disso, o maior impacto das alterações de temperatura e disponibilidade de água ocorreu em florestas onde o clima de longo prazo já era relativamente seco. “Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, as florestas mais secas sofrem mais que as mais úmidas, e são, portanto, mais vulneráveis a condições extremas” ressalta Simone Vieira (Nepam/Unicamp), também autora do estudo, “embora as florestas secas tenham mais espécies adaptadas à menor disponibilidade de água, o stress hídrico nessas áreas já é muito alto e um aumento ainda maior faz com que essas espécies cheguem ao seu limite”. Outro estudo de 2022 já apontava para essa mesma conclusão ao analisar aspectos do funcionamento das florestas tropicais que podem garantir maior ou menor resiliência desses ecossistemas às mudanças climáticas globais.

Esses diferentes estudos nos auxiliam a compreender o funcionamento das florestas e mecanismos que achávamos que seriam diferentes. Ainda precisamos caminhar para compreender outros mecanismos como, por exemplo, quais interações entre espécies podem amplificar ou diminuir esses efeitos que encontramos”, conclui Simone Vieira.

 

Artigo completo (em inglês, acesso livre): Bennett, A.C., Rodrigues de Sousa, T., Monteagudo-Mendoza, A. et al. Sensitivity of South American tropical forests to an extreme climate anomaly. Nat. Clim. Chang. (2023). https://doi.org/10.1038/s41558-023-01776-4

Posts relacionados